História Circular
"Quantos lados tem um círculo? Dois: o de dentro e o de fora".
Ele caminhava meio confuso, meio incerto do que estava realmente fazendo, bebericando uns goles de água. Alguma coisa o incomodava, lhe dando uma sensação de estranheza, mas ele não sabia definir o que poderia ser. Sua única certeza era dita pelo seu relógio digital barato: estava na hora de começar a aula. Era um pouco mais de 8h da manhã.
Lançou o copinho descartável no lixo antes de entrar na sala de aula. Entrou um pouco atrasado: 2 minutos. Encontrou seus alunos como de costume, cumprimentou a turma com um "Bom dia" corriqueiro e sem pretensão de ser respondido. Alguns alunos responderam, outros ficaram indiferentes e alguns outros continuaram meio sonolentos.
Iniciou a aula, não sentiu necessidade de fazer a chamada da turma, sabia que todos estavam lá. Começou relembrando o que tinha sido visto na aula passada. Por um instante pensou que estivesse fazendo isso pela milésima vez. Talvez fosse apenas o cançaso ou talvez fosse melhor mudar um pouco de área, ir lecionar em outra escola, outros conteúdos. Bom, agora não podia ficar parado. Continuou a aula, meio monótona, meio sem graça. Uma pitada de humor aqui ou ali para tentar despertar os mais sonolentos. Como retribuição, alguns sorrisos meio tímidos.
Ao final de uma hora de aula. Fez uma pausa. Relembrou o que estavam estudando, tentou mostrar outros exemplos para reforçar o conteúdo. Novamente, a sensação de estar se repetindo surgiu. Balançou a cabeça de leve, tentando afastar essa ideia tola e prosseguiu com a aula.
Ao final da aula, incluiu uma pequena lista de exercícios e um trabalho para entregar na semana seguinte. Definitivamente, alguma coisa não estava certa, pois agora ele se lembrava nitidamente de já ter passado essas mesmas tarefas. Mas não poderia ser, só havia essa turma com esse conteúdo específico.
Despediu-se apressadamente dos alunos. Teria apenas 10 minutos antes da próxima aula. Ao sair da sala de aula, deparou-se um homem vagamente familiar. Sentiu que deveria conversar com esse estranho. Seria algum pai de aluno? Um novo professor?
Para a surpresa do professor, foi o estranho que falou primeiro: "Aqui estamos! E sempre o mesmo assunto, não é?" O professor conseguiu verbalizar apenas um "não entendo!". O estranho foi enigmático: "Estamos sobre a borda de um círculo. O nosso caminho nos leva ao ponto de partida. Sempre que iniciamos um novo começo, esquecemos o princípio e tudo aquilo que já realizamos. Somos obrigados a repetir tudo o fizemos no ciclo anterior!". O professor tentou, em vão, arrumar as ideias na cabeça. "O que esse estranho queria dizer com tudo isso?", pensou. Antes de chegar a uma solução olhou para o relógio. Agora tinha apenas 5 minutos antes de começar a próxima aula. Sentiu sede. Olhou rapidamente para o estranho, falou: "Tenho que ir, depois conversamos". O estranho respondeu simplesmente, como se já esperasse por esta resposta: "Eu sei". A expressão geral do estranho era de calma aparente e uma certa impaciência latente.
O professor deixou o estranho e seu enigmas. Era necessário apagar da sua mente aquela conversa desprovida de sentido. Não queria que aquilo pertubasse sua próxima aula. Foi à sala dos professores, onde um grande relógio de parede decretava: são 8h! Pegou um copo descartável com água e caminhou, meio confuso em direção a sala de aula.
F. J. Alves
http://alfanumericus.blogspot.com/
5 comentários:
gostei do blog, parabens ._.
Vivendo e não aprendendo...
Adorei. Eu não sou uma especialista mas posso dizer que o texto está super bem construído e tem uma ótima dinâmica de leitura. Parabéns. Adorei o blog.
realmente, ótima iniciativa!
Nossa ...me sinto assim no decorre de minhas aulas na faculdade...ultimamente me sinto assim...aulas chatas demais pra mim...hahah
texto fantástico...
=]
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